Ela se chama Mirra.
Ou foi assim que se apresentou quando chegou à floresta.
Os outros não perguntaram se era nome ou metáfora.
Mirra é magra como um lamento.
Fala pouco.
Mas quando fala, as palavras caem como sementes:
ficam em silêncio por um tempo,
e depois, brotam onde menos se espera.
Ela tem um caderno feito de pele.
Nele, escreve nomes.
Não os que ouve —
mas os que sente que existiram.
Diz que é uma cartógrafa do que já não é.
Que cada nome esquecido é uma raiz perdida,
e que seu papel é tentar desenhar o mapa do que a floresta apagou.
Nos últimos dias, um nome começou a sussurrar dentro dela.
Não completo.
Não claro.
Mas constante.
El…
El…
ias.
Toda vez que ela tenta escrevê-lo,
a tinta sangra no papel.
E o nome se dissolve.
Mas a sensação permanece.
Um calor no centro do peito.
Uma ausência específica, com peso e cheiro.
Mirra caminha pela floresta como quem busca um túmulo sem saber onde foi enterrado.
Sente rastros.
Toques.
Ecos de passos.
Até que chega a uma clareira.
No centro, há um corpo.
Ou algo como um corpo.
Parece árvore.
Mas pulsa.
Parece terra.
Mas respira.
Ela se ajoelha.
Encosta a testa no solo.
E então sente:
o nome que tenta escrever
é esse corpo agora.
Ele se foi.
Mas está.
Ela chora.
Mas sem desespero.
Chora como quem reconhece uma constelação esquecida.
Então, pela primeira vez, rasga uma página do caderno.
E deixa-a ali.
Como oferenda.
Ou promessa.
“Se um dia lembrar de mim,”
“me chama.”
E parte.
Sem olhar para trás.
Porque agora ela carrega um novo nome.
E um novo mapa começa a se desenhar dentro dela.
(Continua...)
Conto: Odair José, Poeta Cacerense
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