segunda-feira, 30 de janeiro de 2023

Conhecimento

Não nasci com conhecimento, mas, desde cedo, busquei alcançá-lo. 
Hoje transmito o conhecimento que adquiri. 
Não sou sábio e perfeito. 
Mas, nunca deixarei de buscar! 

 Pensamento: Odair José, Poeta Cacerense

segunda-feira, 16 de janeiro de 2023

Percalço

    A história que relato aqui pode soar um tanto estranha para a maioria dos leitores que correm os olhos por essas mal traçadas linhas e, pode, também, ser surpreendente para outros. No entanto, a pessoa que contou autorizou-me a relatar os fatos desde que não revelasse a fonte. Logicamente que nunca faria isso.   
 
    Ele conta que passou alguns dias bem ruins e que até pensou que não sobreviveria de tanta dor que sentia. O coração estava estraçalhado e sentia um misto de raiva e compaixão ao mesmo tempo. Conta ele que tinha uma vida tranquila. Havia economizado um dinheirinho e levava uma vida um tanto monótona. Uma vez por semana ele ligava para uma cafetina e ela lhe apresentava uma garota. Ficava com ela, às vezes no quarto oferecido pela cafetina, outras vezes pagava pela saída da garota e a levava para o seu quarto. Tinha suas vantagens e desvantagens, relata ele. Durante algum tempo viveu nessa rotina. Ganhava razoavelmente e poderia se manter assim por muito tempo.  Mas, como ele mesmo afirma, sempre tem um capeta para atrapalhar. E o “capeta” que ele descreve foi uma garota. 
 
    Era uma sexta-feira e ele queria só tomar uma cerveja e descansar. Aceitou o convite de um amigo e foram para o bar da cafetina. Havia por lá algumas garotas que se refrescavam em uma grande bacia azul, enquanto outras conversavam debaixo de uma sombra. Foi então que ele a viu. Era, com certeza, nova naquele local porque não se lembrava de tê-la visto por ali em outras ocasiões.  Ela saiu do banho, trocou de roupa e andou em sua direção. Havia outras meninas ao lado dele, mas o seu olhar ficou vidrado naquela garota. Ela parecia se exibir diante dele. E foi nesse percalço que eles foram apresentados pela dona do local.  
 
    Gal. Esse era o seu nome fantasia dela. Naquele dia eles não ficaram, mas ela não saia da cabeça dele durante os dias que passaram. Decidiu, então, que iria vê-la no próximo final de semana. Ao chegar no local percebeu que não era o único que estava ali por ela. Tinha outros homens que ele não conhecia e pelo movimento da casa pôde perceber que boa parte deles estavam ali por ela. Sentiu uma ponta de ciúmes. Achou que estava ficando louco. Que droga era aquela? Não conseguia pensar direito. Ela ao vê-lo, esboçou um sorriso. Tinha uma boca linda e os lábios estavam coberto de um batom vermelho que destacava sua sensualidade.  Outras garotas foram até ele, mas não queria ficar com nenhuma. Durante algum tempo observou ela se jogando em outros braços e isso o incomodava muito. Resolveu ir embora. Voltaria outro dia.  
 
    Passou o final de semana sem conseguir dormir. Uma angústia tomava conta de sua alma ao fechar os olhos. Em seus pensamentos aparecia aquela garota. Mas, ao mesmo tempo aparecia os outros homens a abraçando e puxando-a para seus braços. Uma cólera corria pelo seu corpo. Na segunda-feira resolveu procurá-la. Imaginou que por se tratar de um início de semana o ambiente estaria com menor movimento. Quanto a isso ele acertou. Final de tarde procurou a cafetina e ela disse que a garota estava dormindo mas que a chamaria. Pensou em não interromper o sono dela, mas não o fez. Queria vê-la de qualquer jeito. Pouco depois ela apareceu. Parecia que tinha sido atropelada por um caminhão. Estava bem abatida e pouco sorria. Sentou-se com ele e começaram a conversar. Ele falou-lhe de tudo que estava sentindo e ela sugeriu que a levasse dali. Ele pagou a saída dela e a levou para casa. Ele conta que ela estava tão cansada que dormiu a noite toda. No outro dia quando ela acordou os dois conversaram e ele propôs a ela tirá-la daquele lugar. Abriu seu coração e disse o quanto ela o havia conquistado. Ela ainda lhe perguntou se tinha certeza do que estava dizendo e ele disse que sim.  
 
    Relata ele, com os olhos cheios de lágrimas, que viveram bem por quase dois meses. Ela parecia estar bem vivendo ao lado dele. Os dois dormiam juntos, assistiam filmes, conversavam, bebiam vinhos e sorriam. Ele estava muito feliz. Aquela garota simplesmente era a razão da sua felicidade. Mas, um dia a tarde, ao chegar do trabalho encontrou a casa trancada. Sentiu um aperto no coração. Teria acontecido alguma coisa? Abriu a porta e entrou dentro de casa. Logo viu a carta sobre a mesinha na cozinha. Com o coração batendo forte sentou-se e abriu a carta. Nela ele encontrou as palavras que dilacerou seu coração. Ela dizia que agradecia muito por tudo que ele tinha feito por ela, sentia por ele um carinho enorme, mas não conseguiria viver essa vida por muito tempo. "Sinto saudades da bagunça do bar, dos homens me procurando, brigando por mim, das músicas e das bebidas. Não posso ser uma dona de casa. Me perdoe".  
 
    Por um instante ele sentiu seu mundo desabar. A dor no coração era tamanha que seus pés tremiam. Uma vontade louca de correr até aquele bar e matá-la. Que mulher desgraçada! Como pode acabar assim com a minha vida?  Conta ele que durante alguns dias não conseguia nem sair de casa. Uma dor tremenda tomava conta de sua alma. Pensava nela o tempo todo. Em seus pensamentos estava aquela garota. Aquela mulher sensual. Aquela prostituta. Aquela puta!  
 
    Essa história muito me comoveu. Em minhas divagações me pergunto se isso é amor? Tenho acompanhado a sua recuperação e vejo o quanto ele a ama. Vejo o seu sofrimento em saber onde ela está, mas não saber com quem ela está. Espero que ele logo se recupere desse infortúnio e encontre uma pessoa menos problemática para viver ao lado dele. Ele é uma boa pessoa.  
 
Conto: Odair José, Poeta e Escritor Cacerense

segunda-feira, 9 de janeiro de 2023

No Califórnia

    - Vai ser hoje a noite! 
    Marcão chegou correndo e atravessou o portão de madeira que cercava a casa do amigo. 
    - No Califórnia? - Indagou o amigo. 
    - É. 
    O amigo balançou a cabeça negativamente. 
    - Não é muito perigoso? 
    - Que nada! Ela está dando sopa e o marido dela é um bosta! 
    O amigo sabia que Marcão estava falando de Tereza, uma linda morena que conheciam desde solteira. Tereza era muito bonita. Morena de corpo bem torneado fazia a festa nos bailes noturnos da cidade com seu gingado e sedução. Quando ela entrava no salão podia se ouvir um burburinho dos homens e mulheres presentes. Os homens, em sua maioria, por desejo. As mulheres, em sua maioria, por inveja. 
    A jovem tinha casado a algum tempo o que havia tirado o ânimo de alguns de seus pretendentes. Mas não de Marcão. 
    - O cara é policial. - Disse o amigo enquanto Marcão sentava-se no banco na varanda da sua casa. 
    - E o que isso tem a ver comigo? 
    O amigo pensou por um minuto. A fama de Marcão era muito grande na cidade. Não perdoava ninguém. Nunca tivera medo das mulheres. Era um sedutor. Algumas diziam cafajeste mesmo. Em suas aventuras costumava se envolver com mulheres casadas o que já havia lhe causado algum transtorno em diferentes ocasiões. Mas ele, como sempre, se sai bem dessas situações. Era muito popular e jeitoso para driblar as dificuldades. 
    - Tenho um tesão nessa menina desde muito tempo. 
    - Mas e o marido dela? Não vai estar lá? 
    Marcão sorriu com a pergunta do amigo. 
    - Ai é que está - Disse ele eufórico - ele não vai estar porque fiquei sabendo que está em serviço e mesmo que estivesse, eu daria um jeitinho de pegar aquela mulher. Tô louco por ela! 
    - Cara - disse o amigo - Você é meio maluco. Eu teria medo de fazer uma merda dessa. 
    - Por isso você não pega ninguém! 
    Houve um silêncio por alguns minutos e Marcão disse: 
    - Hoje a noite no Califórnia. 

    A noite de sábado prometia muito. A cidade estava em polvorosa. Uma banda de lambadão e rasqueado vindo da Capital tocava no clube naquela noite. O Califórnia estava em seu auge. No salão de danças o arrasta-pé corria solto. O cheiro de bebidas, cigarros, suor e perfume barato se misturavam e provocavam um odor único no ambiente. Uma fumaça e as luzes coloridas davam o tom nostálgicos das noites cacerenses. Quem tentava conversar tinha que quase gritar devido o som alto das músicas. Nas margens da pista cadeiras dispostas nas mesas e pessoas se acotovelando pelo ambiente interno. Do lado de fora, pessoas entrando e saindo o tempo todo. Dois homens fortes faziam a segurança do local e apenas observavam as pessoas que entravam e saiam. 
    - Lá está ela! - Disse Marcão para o amigo e apontou uma mesa do outro lado de onde eles estavam. 
    Tereza estava deslumbrante. O corpo moreno dentro de um vestido curto e colado ao corpo a deixava ainda mais sensual. 
    - Vou dançar com ela. 
    O amigo ficou só observando. Marcão caminhou até a mulher. Estendeu a mão. Ela sorriu e levantou-se para dançar. As amigas se entreolharam. Tocava um lambadão e os dois dançaram algumas músicas. Quem olhava de fora podia perceber as investidas dele. Ela parecia se esquivar o quanto dava de suas cantadas. Houve uma pausa quando os cantores da banda pediu um tempo para beberem água. Ela voltou para sua mesa e suas amigas enquanto Marcão foi até o balcão e pegou duas cervejas e voltou para sua mesa. 
    - Ela está meio receosa por causa do marido - Disse ao amigo assim que sentou - Mas eu acho que vai rolar. 
    - Cara - Disse o amigo - você é mesmo maluco. 
    - Quem não arrisca não petisca! 
    Ainda olhava para a mulher do outro lado do salão quando foi tocado no ombro por alguém. 
    - Você que é o Marcão? 
    Virou-se e viu o jovem franzino e de cabelos ondulados que o indagara. 
    - Sim. Por quê? 
    - Porque me disseram que você dá uma de comedor. Que pega todas as mulheres e não se importa se são casadas ou não. 
    Marcão tentou se levantar mas foi impedido quando viu o cano da arma apontado para a sua cabeça. 
    - Saiba que essa foi a última vez! 
    O que se viu a seguir foi assustador. Em fração de segundos o corpo de Marcão jazia estirado no chão. A cabeça tinha sido estourada pela bala. Pessoas corriam desesperadas e derrubavam cadeiras para todos os lados. A banda parou de tocar. O amigo de Marcão estarrecido olhava para um jovem com uma arma ainda fumegante na mão. 

Conto: Odair José, Poeta Cacerense

quinta-feira, 5 de janeiro de 2023

A Onça e as Ovelhas

    Depois de tanta labuta para conseguir ter alguma coisa na vida tenho que me deparar com uma coisa dessas. Só Deus sabe o quanto batalhei para conseguir comprar esse sítio e ter umas vaquinhas que me dão o leite e, com ele, um dinheirinho para comprar o alimento. 
 
    Seguindo conselhos de pessoas próximas e experientes decidi comprar umas ovelhas com a poupança que consegui juntar durante anos. Fiquei tão contente ao ver as ovelhas correndo pelo aprisco. Senti uma verdadeira alegria ao imaginar que em breve estaria vendendo lã e comercializando a carne dos animais. Mas notei que de uma hora para outra minhas ovelhas começaram a desaparecer. Procurei saber o que estava acontecendo e descobri que onças estão se alimentando dos meus animais. Até um bezerro que tinha foi vitima do felino em minhas terras. 
 
    O pior de tudo é que sei que não posso matar esses animais. Primeiro porque já é um dos animais ameaçados de extinção e, por isso, protegido pela legislação. Segundo porque sei que, querendo ou não, fomos nós que invadimos o seu habitat e acabamos com a sua alimentação. O que lamento em tudo isso é que como acontece sempre, o menor é sempre o prejudicado. Quem desmatou em larga escala foi o grande fazendeiro. Mas ele tem como proteger a sua propriedade e, mesmo assim, ainda manda matar as onças que se aventurar pelas suas terras. Eu não tenho como me defender. 
 
Conto: Odair José, Poeta Cacerense