terça-feira, 16 de dezembro de 2025

Uma sombra projetada pelo sol do agora

    A imagem do ontem é uma sombra projetada pelo sol do agora. Está aqui, mas sempre está distante, como um reflexo em água turva. O que chamamos de ontem é o que nunca tocamos, apenas vislumbramos em nossos olhos de memória. Mas é também o que se repete, o que se imortaliza na repetição — o ontem, que nunca é o mesmo, mas sempre parece ser. 
 
    A criação é uma tentativa de capturar o ontem, de torná-lo presente. Escrevemos, pintamos, moldamos, para trazer o que já passou à nossa frente, mas será que conseguimos? Ou estamos apenas criando uma ilusão do que nunca foi? A arte, o pensamento, é uma busca incessante por algo que nos escapa, uma tentativa de fixar o que é efêmero, de tornar visível o invisível. 
 
    E a paranoia, onde entra nisso? Talvez seja a sensação de que estamos sendo observados pela própria criação — que, ao tentar capturar o ontem, começamos a ser consumidos por ele. A paranoia não é o medo de algo que está longe, mas o pavor de que algo de longe já está dentro de nós, e de que não podemos escapar de nós mesmos. Talvez a criação seja, então, uma forma de desespero, uma tentativa de lidar com a sensação de que nunca estamos verdadeiramente aqui, mas sempre numa perpetuação do que já foi, numa repetição que nos destrói e nos cria ao mesmo tempo. 
 
Pensamentos: Odair José, Poeta Cacerense

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