Escrevo porque o silêncio pesa mais do que as palavras. Há dias em que sento diante da página como quem encara um espelho rachado: não busco meu reflexo inteiro, apenas a prova de que ainda existo. Escrever não é dom nem escolha — é uma forma precária de permanecer. Enquanto o mundo exige certezas, a escrita me permite a dúvida, e é nela que respiro.
Escrevo como quem caminha à noite por estradas de terra, guiado por um farol fraco, sabendo que o escuro nunca se dissipa por completo. Cada frase nasce torta, carregando o pó da memória, o calor do tempo e as vozes que ficaram pelo caminho. Não escrevo para explicar a vida, porque ela não se explica; escrevo para suportá-la. A palavra não salva, mas adia o afogamento.
Há uma solidão inevitável nesse ofício: sentar-se consigo mesmo e aceitar que nada é definitivo. A página em branco não pede beleza, pede coragem. E eu escrevo mesmo falhando, porque falhar é mais honesto do que calar. No fundo, escrever é isso: organizar o caos por alguns instantes, fingir que o mundo cabe numa frase e, quando ela termina, aceitar que tudo continua incompleto.
No fim, sigo escrevendo não para ser lido, nem para deixar legado. Escrevo porque, enquanto a palavra respira, eu também respiro. E talvez seja apenas isso que nos mantém vivos: a insistência frágil de dizer “estou aqui”, mesmo sabendo que o tempo, um dia, apagará todas as páginas.
Reflexão: Odair José, Poeta Cacerense

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