sábado, 3 de maio de 2025

Quando o céu se partiu ao meio

    Dizem que, numa noite de calor e silêncios pesados, o céu sobre o Pantanal se partiu ao meio. 
 
    As estrelas tremularam como lamparinas ao vento, e da terra subiu um lamento antigo, tão antigo quanto o barro das margens do rio Paraguai. Os mais velhos dizem que era o espírito de um guardião esquecido, traído por aqueles que juraram protegê-lo. Outros dizem que era só o som das árvores chorando, anunciando o retorno do Monstro. 
 
    Na Vila Maria do Paraguai, as janelas foram fechadas antes da última luz do dia. As galinhas se calaram no poleiro, os cães choraram baixo e até o gado se recolheu, como se soubesse que algo se arrastava pelas águas. 
 
    Naquela mesma noite, um menino sonhou com prata. Não com moedas, nem com medalhas, mas com um escudo enterrado em lama e luz. Ele acordou suando, o peito doendo como se tivesse corrido léguas. Era Samuel — filho da terra, neto das águas. 
 
    E a partir daquele sonho, o mundo nunca mais seria o mesmo. 
 
    Enquanto isso, em uma casa alta de madeira escura, com janelas voltadas para o rio, Elisa fitava o horizonte com os olhos de quem pressente o vento mudar. Seus dedos tocavam as grades da sacada como se quisessem abrir um portão invisível. E, lá dentro, ela sabia: algo vinha para buscá-la, algo que nem o pai com suas armas, nem os homens com seus mapas, poderiam deter. 
 
    Na mata fechada, o Monstro acordou. 
 
    E o destino começou a caminhar, pisando leve, como quem não quer acordar os vivos. 
 
Conto: Odair José, Poeta Cacerense 
 
Obs. (EM BREVE - O Cavaleiro com Escudo de Prata que enfrentou o Monstro no Pantanal)

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