quarta-feira, 11 de junho de 2025

O Viajante da História I - O livro antigo

    O cheiro de papel envelhecido preenchia o ar como um perfume sagrado. Na penumbra da biblioteca, cercado por estantes altas e sombras espessas, o professor Artur Montenegro passava os dedos por lombadas gastas. Era seu ritual favorito nas manhãs frias: mergulhar entre os livros da velha casa colonial que herdara do avô, também historiador. 
 
    Aposentadoria era uma palavra que ainda lhe soava estranha. Depois de quarenta anos em salas de aula, ele não sabia ao certo quem seria sem o quadro-negro, os alunos, os debates apaixonados sobre os rumos da humanidade. 
 
    Naquela manhã, ao reorganizar uma das prateleiras esquecidas, seus dedos tropeçaram em um volume que não reconhecia: capa de couro gasta, sem título, sem autor. Apenas uma espiral dourada gravada no centro. 
 
    Ao abri-lo, as primeiras páginas continham ilustrações de antigos mapas, trechos manuscritos em uma caligrafia quase arcaica. Mas no centro do livro — curioso e fora de lugar — havia um conjunto de páginas amarelecidas completamente em branco. 
 
    Com o coração batendo forte, Artur pegou sua velha caneta-tinteiro e, quase sem pensar, escreveu: 
 
    "14 de julho de 1789 – Paris" 
 
    No instante seguinte, as letras desapareceram da folha. E a sala pareceu estremecer. O ar se comprimiu. Um redemoinho de vento e luz envolveu seu corpo. Quando os sentidos voltaram, ele estava de pé no meio de uma multidão... e, à frente, a Bastilha.
 
Continua...
 
Conto: Odair José, Poeta Cacerense

Nenhum comentário:

Postar um comentário