sexta-feira, 22 de janeiro de 2021

Minhas palavras de amor não servem para nada

    Sorrateiramente. Essa talvez seja a melhor descrição para descrever a forma com que ela deixou-me naquela noite. Estava muito cansado do serviço. Aquele dia parecia que todos os problemas da empresa tinham surgidos para serem resolvidos no mesmo dia. E isso causou um estresse total nos funcionários e direção da empresa. Eu, como sempre tentava ser equilibrado, perdi a calma com um dos meus subalternos por questão banal que nem me lembro mais qual foi. Então, imagina a minha situação. Estava muito cansado da labuta e a única coisa que queria era dormir. 
    Tirei os sapatos. Como eles me incomodavam. Se pudesse trabalharia sem sapatos. Deitei-me no sofá e liguei a TV. Como sempre não passava nada que presta. Mudei de canal algumas vezes e acabei cochilando. Foi quando ela me chamou. 
    - Vá deitar na cama. - Disse com uma voz suave. Deveria ter notado. Afinal, nos últimos tempos ela só falava gritando. Andava sempre entediada. Dizia que sofria muito a solidão e o desprezo. Não me lembro bem de ter feito o trajeto do sofá até a cama, mas sei que me deitei na cama. Pois foi lá que acordei quando o sol batia na janela. 
    Foi estranho não tê-la por perto. Mas eu demorei a perceber que ela não estava mais ali. O que havia acontecido? Não me lembro de termos brigado na noite anterior. Me lembro sim de ouvi-la reclamando de alguma coisa que não sei bem o que era. Ela costumava conversar comigo. Eu estava de corpo presente. Os pensamentos, porém, sempre estavam longe. Sei que isso a incomodava. No entanto, não sabia como lidar com essa questão. Eu tinha muita coisa na cabeça. Andava sempre ocupado com tantas coisas que não dava muita atenção para quem estava a minha volta. 
    Tomei um banho e fiz um café. Estava silencioso na minha cadeira enquanto tomava o meu café quando percebi o bilhete na fruteira. Junto com as bananas e laranjas um pequeno bilhete apontava para mim querendo dizer-me alguma coisa. Abri-o com cuidado e li o que estava escrito. Poucas palavras que diziam muita coisa. 
    - “Não precisa se preocupar comigo. Estou bem. Fique com Deus. Minhas palavras de amor não servem para nada”. 
    Ah! O coração da gente é tão estranho. Nos preparamos para muito e sofremos por pouco. Como explicar as coisas do coração? Um território desconhecido. Uma terra sem lei. Um mundo sem fronteiras. Um universo de ilusão. E então, neste momento, você percebe a sua insignificância no mundo dos mortais. O que é a vida? O que é o viver senão sofrer? Pernas paralisadas. Boca emudecida. Olhos lacrimejantes. Sonhos destruídos. Enfiados dentro de uma mala e levados embora. Histórias tão bonitas construídas ao longo do tempo e que agora são desfeitas. 
    Nem levanto da minha cadeira. Por um tempo faço uma reflexão em tudo o que aconteceu. Vale a pena lutar por um amor que não mais trás a alegria que costumava trazer? Perceber que o momento certo de cada um buscar o seu destino nos faz reconhecer a nossa maturidade. Deixar ir embora um amor que não se ajusta mais é o maior sinal de respeito que podemos demonstrar. É preciso ter muita coragem para seguir em frente sem ter ao nosso lado a pessoa pela qual esteve por tanto tempo em nossa vida. Mas, às vezes, isso é necessário. É o melhor a se fazer. 
    Hoje eu não vou sorrir. Não há motivos para isso. Vou caminhar silenciosamente no caminho que tenho pela frente. Nem sempre precisamos estar acompanhado para caminhar a nossa estrada. Na maioria das vezes estamos sozinhos. Sabemos o que nos aconteceu. O que nos deu alegria e o que nos causou tristeza. Mas, não sabemos o que vamos encontrar na próxima esquina. Se algo que nos fará sorrir ou algo que nos causará lágrimas. Parece um pensamento negativista. E, talvez, seja mesmo. No entanto, quem pode me garantir algo diferente? 
 
    Conto: Odair José, Poeta Cacerense

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