quarta-feira, 13 de janeiro de 2021

A morte pede carona

    Colocou o pequeno objeto no porta-luvas do carro. Era uma miniatura do seu herói favorito, o Homem-Aranha. Ainda sorriu ao lembrar do semblante singelo daquela garota que encantara seu coração e que agora o presenteara com aquela miniatura. Ligou o carro e parou na porta da casa do avô. A mãe pedira para levá-lo ao médico para realizar uns exames. Em tempos de Covid-19, todo cuidado era pouco. Amava muito os avós e sempre estivera com eles. Mas, agora, devido ao avanço do vírus e os cuidados necessários para evitá-lo, tomava muito cuidado com eles. O avô tinha problemas de comorbidade e só ia ao médico porque precisava fazer os exames. A mãe fizera mil recomendações antes de sair. “Higienize bem as mãos”; “Use máscara”, “Cuide de seu avô”, “etc, etc”. Confirmava as recomendações acenando com a cabeça. 
    - Que bonito! - Disse o avô com o Homem-Aranha na mão. 
    Viu que o avô tinha pego a miniatura no porta-luvas e o segurava como se o admirasse. 
    - Ganhou de alguém? 
    - Sim! - Respondeu com um sorriso no rosto. 
    - Namorada? 
    - Uma menina que estou gostando. 
    O avô sorriu. 
    - É isso ai garoto. 
    Acompanhou o ancião no consultório tomando todos os cuidados possíveis. Esperou o atendimento. Retornou para casa. Outra vez o velho pegou a miniatura. Parecia admirar o pequeno objeto que o neto havia ganho. Sorriu ao ver o avô com o objeto. Parecia feliz. 
    Três dias depois acordou assustado com a ligação da mãe. 
    - Seu avô foi levado as pressas para o hospital – disse a mãe ao telefone – está com a Covid-19. 
    - Meu Deus! - Exclamou. 
    Correu para o hospital. Não pode entrar por causa das restrições. O avô e a avó foram internados. O estado do avô era grave. Da avó estável. O coração quase saia pela boca. A ansiedade. O medo de perder os avós. Onde poderia ter pego esse maldito vírus? Pensou em todo o caminho percorrido três dias antes. Tomara todos os cuidados. Como isso pode acontecer? 
    Como se tivesse sido atingido por uma marreta no cérebro lembrou da miniatura. O Homem-Aranha. A garota tinha dado a ele. De onde ela vinha naquela manhã? Lembrou que a buscara na saída de uma festa que ela tinha ido para comemorar o aniversário de um amigo da faculdade. 
    - Meu Deus! - Exclamou consigo mesmo. 
    Poderia ser que o vírus estivesse na miniatura. Ela o entregara de presente quando deu carona a ela. Naquele mesmo dia o avô pegou a miniatura. Agora tudo fazia sentido. Sentiu as batidas do coração aumentar de forma descontrolada. Achou que morreria. Poderia estar com o vírus. 
    - Seu avô não resistiu – disse a mãe desconsolada. 
    Seu mundo desabou! 
 
Texto: Odair José, Poeta Cacerense

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