sexta-feira, 1 de janeiro de 2021

As moças e o rastro da Onça


    Final de tarde e costumo ir, sempre que posso, na casa de meu pai vê-lo. Normalmente, fico pouco tempo, mas, ele sempre tem uma história interessante para contar. A de hoje achei um tanto cômica e compartilho com todos vocês. 
    Ele conta que em tempos antigos, quando ainda era criança, o costume das famílias era de que as moças não andassem sem a companhia de um homem. Não importava se fosse uma criança ou um adolescente. A figura masculina era a representação de força, poder ou dominação. Fato era que, mesmo que várias moças saíssem para ir em algum lugar, algum passeio, não poderiam ir sem a presença desse ser masculino. 
    Em uma dessas tardes, lá na antiguidade, nessas terras ainda inóspita, conta ele, um grupo de moças queria fazer um passeio nas regiões afastadas da vila. 
    - É muito perigoso, Raquel – disse uma das mulheres para a filha. 
    - Não tem problema, mãe – respondeu a jovem enquanto tentava dar o laço no vestido de chita – não vou sozinha. Além de mim vai a Cleide, a Nora, a Fia, a Luzia, a Mariquinha e a Julieta. 
    - Mesmo assim é muito perigoso – insistiu a mãe ajudando ela a dar o laço no vestido. 
    - Ah mãe, deixa! 
    Terminou de dar o laço e virou a filha para olhar nos olhos dela. 
    - Só se um dos meninos for com vocês. – falou por fim. 
    - Ah, não mãe! – zangou-se a mocinha – esses guris são uns bocós. 
    - Se não for nenhum dos rapazes vocês não vão e ponto final. 
    Raquel deixou cair os ombros e falou com cara de poucos amigos. 
    - Tá bom, então. Vou chamar o Agnaldo para ir com a gente.
    As sete garotas faziam a maior algazarra enquanto caminhavam pelo estreito caminho de cascalho e areia. Conversavam alto, riam de qualquer coisa, fofocavam e quebravam galhos de matos nas margens do caminho. 
    Agnaldo, como era de se prever, ia um pouco atrás delas com cara de pouco amigos. Odiava ter que acompanhar essas garotas. Com certeza elas queriam passar a tarde na casa da amiga que morava no sítio distante três quilômetros da vila. Sabia o motivo. Com certeza o vaqueiro novo que havia começado a trabalhar naquela semana. Os boatos na vila era de que o cowboy era muito bonito. 
    Notou quando a mais sapeca do grupo parou repentinamente na beira do riacho que atravessava o caminho. Havia uma pequena ponte de madeira. 
    - O que é isso? – Indagou Mariquinha e apontou para a areia ainda molhada da chuva que havia caído um pouco mais cedo. 
    As garotas cercaram os rastros. Era pegadas de um animal. Com certeza tinha estado ali a pouco tempo e, possivelmente poderia estar por perto. 
    - Acho que é o rastro de uma onça! – Exclamou Luzia. 
    - Ai meu Deus! – Exclamou Fia. – Vamos morrer! 
    A fama das onças naquela região corria longe. Volta e meia ouviam-se histórias de bezerros, vacas e outros animais mortos pelo felino. Em alguns casos, até de vaqueiros e caçadores atacados pelo animal. Essas histórias eram aterradoras. 
    - Calma – Disse Raquel – o Agnaldo está com a gente. Ele é homem! 
    Todas viraram para olhar o rapaz. Ele estava estático. A cor fugira de seu corpo. As moças perceberam que ele estava tremendo igual vara verde. 
    - O que foi? – Perguntaram quase juntas. 
    - Eu caguei nas calças! – Foi o que conseguiu dizer. 
 
Conto: Odair José, Poeta Cacerense

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