domingo, 21 de setembro de 2025

O Pássaro do Coração Silencioso

    Havia um homem que, desde jovem, trazia no peito uma pequena gaiola invisível. Dentro dela vivia um pássaro pálido, de asas frágeis como véus de vidro. O homem o alimentava todos os dias, não com sementes ou água, mas com pensamentos nunca ditos, com desejos que jamais ousaram atravessar os lábios. 
 
    O pássaro crescia daquilo que não podia nascer — sorrisos engolidos, olhares desviados, cartas queimadas antes de escritas. E, embora suas asas jamais se movessem, ele cantava. Seu canto não era doce, mas profundo, como um eco vindo de uma caverna subterrânea. Era o som de um amor que ninguém jamais conheceria. 
 
    Com o passar dos anos, o homem percebeu que o pássaro nunca voaria. Preso àquela prisão secreta, sua existência se resumia ao lamento eterno. Mas o homem também percebeu outra coisa: o canto do pássaro atravessava a escuridão do tempo, como se fosse indestrutível. 
 
    Assim, ele compreendeu a maldição: amar em segredo era nutrir um pássaro que jamais conheceria o céu, mas cujo canto sobreviveria a todas as coisas — ao silêncio, à morte, ao esquecimento. 
 
    E o homem partiu deste mundo com o peito vazio de asas, mas repleto de ecos. 
 
    E dizem que, se à noite você encostar o ouvido no silêncio mais profundo, ainda poderá ouvir esse pássaro cantar. 
 
Fábula: Odair José, Poeta Cacerense

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