domingo, 19 de janeiro de 2025

O eco do silêncio

    Marta vivia em um pequeno apartamento no centro da cidade, cercada pelo barulho incessante da vida cotidiana. O marido, Gustavo, era um homem correto, mas distante, preso à rotina do trabalho e às expectativas de um casamento que há muito perdera o brilho. Os filhos, dois adolescentes, viviam imersos em seus próprios mundos digitais, oferecendo a ela apenas o silêncio como resposta à maioria das perguntas. 

    Por anos, Marta desempenhou seu papel com perfeição: esposa dedicada, mãe atenta, profissional eficiente. Mas, à noite, quando o apartamento se acalmava, o vazio dentro dela ganhava voz. Era um chamado insistente, quase imperceptível, mas que, ao longo dos anos, tornou-se impossível de ignorar. 

    Uma manhã, sem aviso, ela se levantou mais cedo do que o habitual. Preparou o café, escreveu um bilhete curto — "Preciso de um tempo. Estou bem. Amo vocês." — e saiu pela porta. Não levou muito: uma mochila com roupas, um caderno e um livro. 

    Marta seguiu para uma cabana isolada na serra, um lugar que descobrira anos antes durante uma viagem de trabalho. Lá, cercada por serras e árvores que sussurravam ao vento, ela encontrou o que buscava: silêncio. 

    Os primeiros dias foram difíceis. Marta se perguntava se havia cometido um erro. Sentia falta do caos familiar, das vozes dos filhos, do toque do marido. Mas, aos poucos, aprendeu a ouvir o mundo ao seu redor — o som das folhas ao vento, o canto dos pássaros, o farfalhar dos pequenos animais na floresta. 

    Com o passar dos meses, Marta começou a se redescobrir. Pintava, escrevia, caminhava. Percebeu que havia se perdido ao longo dos anos, tentando ser tudo para todos, menos para si mesma. 

    Seis meses depois, Marta voltou para casa. Não era a mesma mulher que havia partido. Seus olhos brilhavam com uma nova força, e sua presença exalava calma. Gustavo a recebeu com um misto de alívio e hesitação, e os filhos a abraçaram sem entender totalmente o motivo da sua ausência. 

    Marta não tentou explicar tudo. Apenas prometeu a si mesma que, dali em diante, nunca mais se deixaria desaparecer. E, em pequenas doses, ela manteve aquele eco de silêncio dentro de si, como um lembrete de quem realmente era. 

Conto: Odair José, Poeta Cacerense