sábado, 22 de abril de 2023

O pedido de casamento

    José Carlos viu Rodrigo se aproximando. Tinha um semblante preocupado e ansioso. Não sabia o que dizer para ele. Como iria contar?
 
    Helen tinha saído de sua cidade natal há pouco mais de dois meses. Sem muita estrutura familiar e perspectiva no lugar onde nascera, resolveu atender ao pedido do irmão, Hélio, para que viesse morar com ele na cidade grande. Tinha a promessa de trabalhar em um Supermercado cujo dono era conhecido de Hélio e, na visão deste, os dois poderiam acabar se casando. Helen, nos seus 18 anos, carregava em si a beleza da juventude. Era uma morena esbelta de sorriso tímido e lindos olhos cor de mel. Mas, sua maior virtude era o jeito gentil de tratar as pessoas. E foi justamente esse jeitinho meigo que atraiu a atenção de Rodrigo.
 
    Com pouco mais de um mês que ela tinha vindo morar com o irmão na cidade, aconteceu uma tragédia. Dois ladrões invadiram a casa onde eles estavam morando e Hélio foi atingido por um disparo de arma de fogo de um dos ladrões. Eles levaram todo o dinheiro que o rapaz tinha guardado durante alguns anos para comprar uma casa nova. Helen nem sabia que ele escondia o dinheiro em casa. Talvez não confiasse em bancos. No entanto, para desespero dela, os ladrões levaram todo o dinheiro e ainda deixaram-no sem vida. 

    Rodrigo trabalhava com José Carlos na construção de novas vilas. José Carlos, um sargento reformado do exército investia suas economias em vilas e, em uma delas é que Hélio morava e a Helen veio morar com ele. 

    Um dia à tarde Helen ouviu bater na porta e foi atender. Era Rodrigo. 

    - Boa tarde, moça. 

    - Boa tarde. 

    - O Sr. Zé Carlos me mandou vir aqui para resolver o problema do cachorrinho. 

    Helen olhou assustada. 

    - O Pequeno Lula? 

    - É esse o nome dele? 

    - Sim. 

    - Então... – Fez uma pausa. Parecia constrangido. – Os vizinhos reclamaram que ele faz muito barulho. 

    - Sim. Ele late bastante. 

    Houve um silêncio. 

    - Ele era do meu irmão. 

    - Eu sei. 

    - O que vai fazer? - Posso levar ele para um local onde eles cuidam de animais abandonados. Tem um lugar desses no outro bairro aqui perto. 

    Rodrigo pegou Pequeno Lula e acariciou seus pelos. Despediu-se da moça e foi embora. 

    Dois dias depois Helen procurou Rodrigo. 

    - Preciso de um favor. 

    - Sim. 

    - Não sei como vou fazer para pagar o aluguel. Todo o dinheiro que meu irmão tinha foi levado pelos ladrões. O emprego que teria no Supermercado não deu certo. 

    - Por que não deu certo? 

    - O dono disse-me que tinha um trato com meu irmão. Iria arrumar o emprego se eu me casasse com ele. Eu não quis. 

    Rodrigo deixou-se ser surpreendido com um suspiro de alívio. Tentou disfarçar. A moça notou. 

    - Esse mês resolvo para você. Eu pago. 

    - Não sei como agradecer. Mas, assim que conseguir trabalhar eu vou te pagar. 

    Rodrigo sorriu. 

    Era um homem já de meia idade. Tinha em seu rosto as marcas da labuta da vida. Alguns cabelos grisalhos na cabeça e na barba sempre curtinha. Era sempre sério. Dificilmente alguém o via brincando. Sempre trabalhando. 

    Alguns dias depois Rodrigo a procurou. Havia acabado de escurecer quando ele bateu na porta da casa dela. 

    - Boa noite. – Disse ele. 

    - Boa noite. Aconteceu alguma coisa? 

    - Não. 

    Houve um momento de silêncio. Os dois de pé, um em frente do outro. Ele do lado de fora, ela do lado de dentro. 

    - Preciso te falar uma coisa. – Disse ele rompendo aquele silêncio embaraçoso. 

    - Sim. 

    - Então... Nem sei como dizer isso. 

    Ela sorriu. 

    - Sei que você dispensou o rapaz lá do Supermercado. Mas, eu desde que vi você chegando aqui, passei a gostar de você. 

    Helen ficou rubra. Rodrigo tremia. 

    - Eu nunca tive um relacionamento sério. Já trabalho com o Sr. Zé Carlos há quase 15 anos e venho juntando umas economias. Não quero ficar só como ele. Tenho pensado em arrumar uma pessoa para construir juntos um lar e ter filhos. E não quero que pense que estou me aproveitando da situação. Não. Se você não quiser eu vou entender perfeitamente. 

    Helen engolia em seco. 

    - Por isso, vim aqui te pedir em casamento. Você quer casar comigo? 

    Helen estática. Olhos arregalados. 

    - Tudo bem. – Disse ele. – Se você disser não eu vou entender. 

    - Posso pensar? 

    Ele acenou com a cabeça e saiu. 

    Dois dias que se passaram como uma eternidade para Rodrigo. 

    - Eu pensei muito sobre o seu pedido de casamento. E, mesmo você já sendo um homem bem mais velho que eu, consegui ver a sinceridade em suas palavras. Eu aceito o seu pedido. 

    Rodrigo, com o coração batendo forte, procurou José Carlos. 

    - Ela é muito nova para você. 

    Rodrigo começou a preparar as coisas. Foram uma tarde ver uma casa em um bairro próximo. Os dois gostaram da casa. Não falaram muito, mas imaginaram o lar. Imaginaram as crianças correndo pela casa. Sim. Eles seriam felizes. 

    Era tardezinha quando Helen voltava do mercadinho. Ela ouviu uns latidos. 

    - Pequeno Lula? 

    Olhou para um terreno baldio e em meio às folhagens viu o cachorrinho. Acuava alguma coisa no meio do matagal. Foi até lá. 

    - O que você está fazendo aqui? – Disse ao pegá-lo. 

    Dois jovens saíram de dentro do mato. 

    - Por favor! – Pediu Helen desesperada. 

    Já escurecia quando ela gritou por socorro. José Carlos passava na rua ao longe. Não chegou a tempo de salvá-la. Tão jovem. Ainda segurou o corpo quente dela antes de dar o último suspiro. 

    - Rodrigo... 

    José Carlos viu Rodrigo se aproximando. Tinha um semblante preocupado e ansioso. Não sabia o que dizer para ele. Como iria contar? 

Conto: Odair José, o Poeta Cacerense

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